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24 Fevereiro, 2021

O Fundo Garantidor Solidário na nova Lei do Agronegócio

A Lei nº 13.986/2020, conhecida como Lei do Agronegócio e resultado da conversão da Medida Provisória nº 897/2019, representou marco regulatório importante nesse setor produtivo. Entre seus vários dispositivos, esse ato normativo objetivou principalmente viabilizar o acesso do produtor rural a novas formas de crédito, de forma a potencializar a produção agropecuária nacional.

Entre as medidas instituídas por essa Lei, está o Fundo Garantidor Solidário (FGS), que surge também no objetivo amplo do ato normativo de facilitar o acesso ao crédito rural.

No presente artigo, portanto, buscar-se-á explicitar o que é o FGS, qual é a forma de sua constituição e de sua extinção, de modo a equipar o leitor com mais uma ferramenta para o desenvolvimento bem-sucedido de suas atividades rurais.

1. Conceito

O Fundo Garantidor Solidário (FGS), conforme orienta a Lei nº 13.986/2020, é pessoa jurídica cujo patrimônio poderá ser utilizado como garantia em qualquer operação de crédito realizada por produtores rurais, inclusive aquelas resultantes de consolidação de dívidas, bem como no financiamento para implantação e operação de infraestruturas de conectividade rural.

Inicialmente intitulado de “Fundo de Aval Fraterno” na MP do Agro, cabe destacar inicialmente que o FGS não é fundo de investimentos tradicional, a despeito do seu nome, cuja regulação é responsabilidade da Comissão de Valores Mobiliários. Isso se dá, em primeiro lugar, em função de ausência de previsão expressa nesse sentido. Ademais, o objetivo primário de sua constituição não é lucro, como se irá demonstrar, ao contrário do que caracteriza os fundos de investimentos.
O que deve o empreendedor rural objetivar ao constituir um FGS, em primeiro lugar, é o maior acesso a linhas de crédito, que poderão utilizar do Fundo como garantia. Por meio do Fundo, poderão os produtores rurais ampliar o leque de empréstimos bancários a que tem acesso, ensejando dessa forma o estímulo à sua produção.
Os valores que integram o Fundo, justamente para dar cumprimento a esse objetivo de atrair o interesse dos que oferecem linhas de crédito rural, não poderão ser utilizados para pagar outra dívida, dando maior garantia para a instituição que viabiliza a operação de crédito.Além disso, ressalvada exceção sobre a qual se debruçará posteriormente, o FGS não pagará rendimentos aos seus cotistas, como consequência do fato de que seu objetivo primário não é o lucro, mas o acesso a linhas de crédito por meio da ampliação de garantia.

Destaca-se, finalmente, que a garantia prestada pelo FGS ficará limitada, naturalmente, ao valor que o constitui, não podendo ele ser utilizado para oferecer garantia em valor que o extrapole.

2. Constituição

A constituição do FGS deve contar com dois devedores, no mínimo, com o credor e com o garantidor, se houver. O limite máximo do número de devedores, inicialmente previsto na MP do Agro como dez, não foi definido em Lei, podendo ser posteriormente estabelecido pelo Poder Executivo.Como nos fundos de investimentos tradicionais, o FGS também é composto a partir de valor integralizado por cada um de seus integrantes, de acordo com o papel que exercem na relação de crédito.

A cota primária, de responsabilidade dos devedores, deve ser correspondente a no mínimo 4% dos saldos devedores das operações financeiras garantidas pelo FGS. A cota secundária, oferecida pelos próprios credores ou pelos credores originais, na hipótese de consolidação de dívida, também deve ser de 4% sobre esse valor. Por fim, a cota terciária, prestada pelo garantidor, quando presente, deve ser de 2%.Essas porcentagens podem ser majoradas, a depender dos interesses concretos das partes envolvidas na contração da operação de crédito, mas para isso devem ser mantidas a proporção entre as cotas de mesma categoria de participantes.Além disso, o valor a ser oferecido por garantidor a título de prestação de cota terciária poderá ser integralizado por meio da redução do saldo devedor do credor garantido pelo FGS.

O processo de constituição do FGS deve ser feito a partir de um Estatuto, como no caso das demais pessoas jurídicas de direito privado, que disporá de forma detalhada sobre a sua constituição e administração, a remuneração do administrador, a utilização dos recursos e sua forma de atualização, a representação ativa e passiva do fundo, entre outras previsões de que o FGS necessita para operar.Aqui, cabe destacar que a Lei concedeu especial liberdade àqueles que pretendem constituir um Fundo, não detalhando em demasiado a forma pelo qual ele deve ser administrado ou operado. Com isso, poderá o setor privado no agronegócio atuar a partir da forma que melhor servir os seus interesses, moldando o FGS de acordo com suas necessidades particulares. 

3. Extinção

Caso os recursos que integram o FGS tenham que ser utilizados em ressarcimento no pagamento de dívida, após o seu vencimento e o não pagamento da parcela ou operação, a utilização de seus recursos deve observar a ordem das cotas primárias, secundárias e terciárias.Essa ordem, prevista em lei, tem intenção clara de incentivar a participação de credores e garantidores no fundo, protegendo o valor com que participaram para apenas as hipóteses em que a sua utilização é estritamente necessária.Essas situações, em que todos os valores que constituem o FGS são exauridos, são uma das possibilidades de extinção do Fundo. A outra delas é a de quitação de todas as dívidas por ele garantidas.Nessa possibilidade, os recursos remanescentes no Fundo deverão ser devolvidos aos cotistas para repor os valores inicialmente aportados, observada a proporção do aporte efetuado pelos cotistas e considerada a ordem de prioridade inversa à da integralização, ou seja, beneficiando em primeiro lugar os cotistas terciários, seguidos dos secundários e depois dos primários.Essa é a única hipótese em que o FGS poderá pagar rendimentos aos seus cotistas, a depender da forma em que ele houver sido administrado e assegurado o pagamento integral da dívida a que ele serve de garantia. 

4. Conclusão

Ao final do presente artigo, resta evidente que o Fundo de Garantia Solidária é uma poderosa ferramenta, que pode abrir um leque de possibilidades ao produtor rural que busca por meio de operações de crédito estimular a sua produção.Nesse contexto, cabe destacar que a sua constituição pode ser mais desafiadora do que aparenta, uma que exige obrigatoriamente a participação de credor com o aporte de novos recursos. A sua utilização, portanto, dependerá também do apetite dos credores para fazê-lo, variável volátil que depende fortemente das condições econômicas à época da operação do crédito.Para além disso, urge ressaltar a necessidade de atenção e detalhismo no processo de constituição do FGS. Como a Lei nº 13.986/2020 reservou amplo espaço de liberdade para os integrantes do Fundo, é necessário que aquele que busca constituí-lo esteja devidamente assessorado e preparado com o fim de assegurar que a sua criação lhe seja vantajosa e justa.


Dal Maso Advogados

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