Acompanhe os nossos conteúdos e fique por dentro

27 Maio, 2020

A PROPRIEDADE RURAL EM AFETAÇÃO NA NOVA LEI DO AGRONEGÓCIO

A Lei nº 13.986, de 7 de abril de 2020, advinda da Medida Provisória nº 897/2019, conhecida como MP do Agro, representa inovação legal relevante para o setor do agronegócio, particularmente em relação à tomada de crédito rural e ao financiamento da cadeia de produção nesse âmbito. Se aplicadas com apoio de um profissional jurídico competente, pode significar uma ampliação das oportunidades de crédito para produtores rurais de Luis Eduardo Magalhães.

Entre as medidas previstas no novo marco legal estão, entre outros:

i) a criação do Fundo Garantidor Solidário (FGS), destinado a servir de garantia para as operações de crédito realizados por produtores rurais;
ii) a instituição da Cédula Imobiliária Rural (CIR), que representa a promessa de pagamento em dinheiro decorrente de operação de crédito, e,
iii) objeto de análise do presente artigo, a criação do instituto do patrimônio rural em afetação, como forma de viabilizar a CIR e a Cédula de Produto Rural (CPR).

O presente artigo, portanto, objetiva entender o que é o regime de patrimônio rural em afetação, quais são os efeitos dele no patrimônio rural, e as finalidades da sujeição de patrimônio rural a esse regime. O conceito de patrimônio em afetação não é novo no ordenamento jurídico brasileiro. Em termos gerais, submeter determinado patrimônio a regime de afetação significa segregar determinados bens de um patrimônio e vinculá-los a finalidades específicas. O proprietário do bem continua exercendo essa condição, mas limitado significativamente no que pode ou não fazer em relação ao patrimônio em afetação até que se encerrem todos os direitos ou obrigações vinculados a ele.

Esse regime jurídico acontece, de maneira em geral, para que o patrimônio em afetação possa servir de garantia para um credor, aumentando a certeza de que o proprietário adimplirá determinado negócio jurídico. Dentro do direito imobiliário, já existe o conceito de patrimônio em afetação para as incorporações imobiliárias. Nesse contexto, ele serve para oferecer ao futuro adquirente de imóvel segurança na aquisição em face de empreiteiras ou construtoras. Para isso, o incorporador, representado na figura da empreiteira, reserva irreversivelmente parte de seu patrimônio como exclusivo para o desenvolvimento de determinada incorporação. A partir desse momento, o incorporador não poderá usar daquele patrimônio para outro fim, e, se eventualmente falir ou inadimplir com suas dívidas, o patrimônio em afetação não será alcançado.

A Lei nº 13.896/2020, Lei do Agro, estabeleceu o instituto do patrimônio em afetação no contexto do patrimônio rural. Agora, o imóvel rural ou fração dele poderá ser submetido ao regime de afetação por vontade do seu proprietário, seja pessoa física ou jurídica. Nesse caso, o terreno, as acessões, as benfeitorias nele fixadas (exceto as lavouras, os bens móveis e os semoventes) constituirão patrimônio rural em afetação. Isso se faz com um objetivo claro: utilizar o patrimônio rural em afetação como garantia real em operações financeiras contratadas pelo proprietário por meio de Cédula Imobiliária Rural (CIR) ou por meio da emissão da Cédula de Produto Rural (CPR). O primeiro, criado pela Lei do Agronegócio, é título de crédito nominativo, transferível e de livre negociação, representativo de: I – promessa de pagamento em dinheiro, decorrente de operação de crédito de qualquer modalidade; e II – obrigação de entregar, em favor do credor, bem imóvel rural, ou fração deste, vinculado ao patrimônio rural em afetação, nas hipóteses em que não houver o pagamento da operação até a data do vencimento. O segundo, por sua vez, criado pela Lei nº 8.929/1994, representa promessa de entrega de produtos rurais, com ou sem garantias cedularmente constituídas.

Para que o produtor possa submeter seu patrimônio rural a regime de afetação, e assim poder emitir CIR ou CPR, o patrimônio não pode se caracterizar em nenhuma das seguintes categorias:

I – imóvel já gravado por hipoteca, por alienação fiduciária de coisa imóvel ou por outro ônus real, entre outros

II – pequena propriedade rural, conforme definição da Lei da Reforma Agrária;

III – área de tamanho inferior ao módulo rural ou à fração mínima de parcelamento, o que for menor, nos termos da Lei do Sistema Nacional de Cadastro Rural; ou IV – o bem de família de que trata o Código Civil, restrito à sede de moradia com os respectivos bens móveis.

Após submeter o patrimônio rural a regime de afetação, algumas consequências nele recaem, desde que vinculado a CIR ou a CPR, na medida das garantias expressas nessas cédulas. Em primeiro lugar, os bens e direitos integrantes do patrimônio rural em afetação se tornarão independentes dos bens, direitos e obrigações do patrimônio geral de seu proprietário ou de outros patrimônios rurais em afetação por ele constituídos. Além disso, o patrimônio rural em afetação não poderá ser dado como garantia real em qualquer outro negócio jurídico a não na emissão de CIR ou de CPR. O imóvel rural em regime de afetação não poderá ser comprado, vendido, doado, parcelado ou de qualquer maneira incorrido em ato translativo de propriedade por iniciativa do proprietário.

Outro efeito da sujeição de patrimônio rural a regime de afetação é que ele não poderá ser utilizado para realizar ou garantir o cumprimento de qualquer outra obrigação assumida pelo proprietário estranha àquela a qual esteja vinculado, se tornando impenhorável e não poderá ser objeto de constrição judicial. Nessa mesma senda, o patrimônio rural em afetação, não será atingido pelos efeitos da decretação de falência, insolvência civil ou recuperação judicial do proprietário de imóvel rural e não integrará a massa concursal.

Para submeter determinado patrimônio rural a regime de afetação, dever-se-á fazer solicitação nesse sentido por meio de registro no cartório de registro de imóveis, com os seguintes elementos, entre outros:

i) documentos comprobatórios da inscrição do imóvel no Cadastro Nacional de Imóveis Rurais (CNIR), do domínio do requerente e da inexistência de ônus de qualquer espécie sobre o patrimônio do requerente e o imóvel rural;

ii) documentos comprobatórios da regularidade fiscal, trabalhista e previdenciária do requerente; e

iii) as coordenadas dos vértices definidores dos limites do patrimônio afetado.

Em relação ao patrimônio rural em afetação, o seu proprietário tem o dever de promover os atos necessários à sua administração e preservação, bem como a de manter-se adimplente com as obrigações tributárias e os encargos fiscais, previdenciários e trabalhistas de sua responsabilidade, incluída a remuneração dos trabalhadores rurais. Por fim, para cancelar a afetação do imóvel rural, deve o seu proprietário fazer requerimento no cartório de registro de imóveis, acompanhado de comprovação de não existência de CIR e de CPR sobre o patrimônio a ser desafetado. Resta evidente, portanto, que o regime do patrimônio rural em afetação surgiu para dar ao produtor rural novas possibilidades para a emissão de crédito. Ao dar o seu imóvel ou fração dele como garantia nas operações de crédito, por exemplo, o proprietário rural pode ter acesso à emissão de Cédula Imobiliária Rural (CIR) em qualquer modalidade de crédito.

Cabe ressaltar, entretanto, que caso o proprietário do patrimônio rural em afetação realize operação de crédito com a emissão de CIR e não pague a operação até a data de seu vencimento, surge ao credor o direito de que o oficial de registro de imóveis processe em seu favor o registro de transmissão da propriedade do imóvel rural, ou da fração, constituinte do patrimônio rural em afetação vinculado à CIR. Assim, os riscos associados à inadimplência da CIR são severos.

Em caso de outras dúvidas, contate nossos especialistas em Agronegócio! Ficaremos satisfeitos em atendê-los.

Dal Maso Advogados

Luís Eduardo Magalhães - BA. 

Dal Maso Advogados

.